domingo, 20 de setembro de 2009

contribuição para "Vozes de Guernica"

Limpar o chão da sala não rende, acabo de limpar e a poeira já se instala sem menor receio. (apagam-se as luzes) Virou noite, mas é dia! - Bem! Ensurdeci, acho que estou morrendo. (pausa) – Que estrondo violento. Escuto ainda meu cachorro latir. Meus pulsos estão molhados. Qual é a cor do meu sangue, é amarelo, é verde, mas não é azul. Vejo as fuligens no pé do meu marido. Sua bota se mostra para mim na menor fresta do sol entre os escombros. Está longe. Meu grito sai sem som. O som no pesadelo não sai, mesmo com muita força. E ainda estou acordada. Não sinto mais as lágrimas no rosto. Meu rosto. Seria bom sentir dor com a mão no rosto. Gostaria de rasgar a minha boca até a garganta e assim dormir. Deus escuta os pensamentos e o demonio ouve nossos murmúrios? Ave Maria cheia de graça, cheia de graça. Ave Maria, ave Maria, Maria, Maria, Maria. Agora e na hora da nossa morte. Nossa morte! Não escuto mais meu cachorro latir. Quanta poeira, quem será que vai limpar isso? Um dia alguém vai limpar. Bendita sois vós entre as mulheres. Já deve ter acabado todo o resto de mundo. Ainda vivem as baratas. Mais barulho. Não existe mais fresta do sol. Várias imagens se formam pra mim na escuridão. Quanto será o limite do sofrimento? Acordo mais uma vez. Desgraçada de mim que não agradecia a luz do dia. Dou graças por não ter filhos. Mas não precisava mais acordar.

Um comentário:

  1. Só alguém que pulsa arte para entender algo assim

    parabéns por perceber.... que bacana!

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